Do micro ao macro, o caminho da eficiência energética
A transição energética é um empreendimento que requer a participação e o compromisso de cada indivíduo.
Do micro ao macro, o caminho da eficiência energética
A transição energética é um empreendimento que requer a participação e o compromisso de cada indivíduo.
Não tenhamos dúvidas! Sim! O impacto de trocarmos uma lâmpada led que seja, contribui para o todo. Sim! O facto de substituirmos um esquentador normal por um de condensação tem impacto. E sim!… o simples gesto de desligarmos os disjuntores e diferenciais não essenciais quando vamos de férias ou de fim-de-semana, contribui para o Desígnio Europeu de 2050. Há que ter plena consciência, não é possível efetuar qualquer transição energética, sem o contributo de cada um de nós.
Após mais de quatro décadas de debates e legislação direcionados para a eficiência energética, uma crise recente, mais uma, trouxe à tona a verdadeira questão que há muito aguardava destaque. Tornou-se claro que a transição energética é um empreendimento que requer a participação e o compromisso de cada indivíduo. Finalmente, a verdadeira questão pode borbulhar à superfície.
Portugal, historicamente, deu um passo importante em 1973, durante a crise do petróleo, ao estabelecer regulamentação pioneira. Essa regulamentação, oficialmente publicada em 1982, Decreto-Lei 58/82, de 26 de Fevereiro, determinou que indústrias consumidoras intensivas de energia deveriam conduzir auditorias energéticas. Isso significava que essas empresas tinham a obrigação de entender qual a origem da energia consumida, qual a sua utilização e por que razão estaria a ser dissipada ou, por outras palavras, desperdiçada. Além disso, as indústrias eram compelidas a implementar medidas para racionalizar o consumo de energia nas instalações. Surpreendentemente, esta regulamentação permanece em vigor até aos dias de hoje, com poucas modificações em relação à sua versão original. Esta legislação em particular, publicada em 1982, repare-se, há 42 anos, obrigava à monitorização dos consumos energéticos e à implementação de medidas que mitigassem esses mesmos consumos, pasme o leitor, 8 anos volvidos após o 25 de Abril de 1974. Inclusivamente, previa e obrigava que, as indústrias consumidoras intensivas de energia – que, à época, infelizmente, eram em número mais avultado – realizassem uma auditoria energética, isto é, que conhecessem, as fontes de energia consumidas, onde, como, quando e porquê as mesmas eram disseminadas, e, mais significativo ainda, que estabelecessem medidas de racionalização de energia, que deveriam ser obrigatoriamente implementadas na instalação em causa. Parece inacreditável que esta legislação pouco tenha evoluído nos 42 anos volvidos.
Desde 1982 até hoje, foi publicado um número infindável de diplomas, regulamentos, portarias, despachos, notas técnicas e afins, cujo objectivo final é similar: contribuir para a eficiência energética do país como um todo. Como tal, e de forma idêntica a outras áreas de actividade, cuja regulamentação não conheço em profundidade, o tema premente não é a falta de regulamentação e, sim, a total ausência de verificação e fiscalização do cumprimento da mesma. Alguém acredita que em Portugal apenas existam cerca de 1400 instalações nestas circunstâncias?
Por todos estes motivos, muito me surpreende que em plena crise energética o PRR continue a não sofrer uma reestruturação profunda e não reforce os concursos que mais candidaturas tiveram. A título de exemplo posso referir que houve cinco alterações na 2ª fase do Programa Edifícios Mais Sustentáveis, a maior parte das quais destinada a reforçar a dotação orçamental, que neste momento se encontra em 135 M€ (inicialmente o valor situava-se na ordem dos 30M€). Traduzindo, o comum cidadão, proprietário de uma fracção, que tendo direito no máximo a 7.500€ de benefício (independentemente de ter vinte casas para melhorar ou apenas uma) e sendo obrigado a investir o valor total da remodelação/instalação antes de saber, sequer, se a mesma seria aprovada, sujeito a processos burocráticos e complexos e, por fim, submetido a requisitos do arco da velha, fê-lo!
Fê-lo, porque queria melhorar as condições da casa onde vive, da fracção que aluga, do património de família, da casa de férias, entre muitas outras situações similares. Quanto ao programa em causa, não se prevê qualquer novo aviso ou reforço, ou ainda a análise das candidaturas cujo prazo de submissão fechou em Outubro passado. O próprio Fundo Ambiental informou no passado dia 22 de Abril que “todas as candidaturas se encontram no estágio “Submetida”. Qualquer atualização ao estágio das candidaturas será notificada a cada candidato, através do endereço eletrónico registado nas mesmas. Até ao momento, não existe previsão da abertura de uma nova fase do programa nem quais os requisitos e condições da mesma.”
No caso dos edifícios de serviços, a situação é mais gritante ainda, apenas um único aviso, dotação total 20M€. De acordo com os planeamentos apresentados e tornados públicos, quer do Governo, quer da Comissão Europeia, está prevista, até 2030, a transferência de 50 mil M€, repito, 50 mil M€, dos quais, de acordo com a informação constante no site do Recuperar Portugal, apenas 1.22% serão investidos na produção de energias a partir de fontes renováveis e/ou eficiência energética. Importa referir, que, dos 610M€ previstos no PRR para a eficiência energética, 240M€ serão destinados à administração pública central, não considerando a local. Contra factos, não há argumentos.
Mudam-se os governos, e neste caso em particular até é admissível que não seja possível mudar a vontade, mas a necessidade emergente de conseguir potenciar todos os fundos possíveis para este propósito, deveria ser uma prioridade.
O futuro passa, indubitavelmente, pelo isolamento de cada m2 de parede em contacto com o exterior, por cada kWh produzido a partir de renováveis, por cada alteração que conduza a uma poupança energética, por muito insignificante que seja, e sim, o Estado, e particularmente, os fundos atribuídos pela União Europeia, podem e devem contribuir para este objectivo. A questão da eficiência energética deve ser sempre estudada, analisada e especialmente incentivada, do micro para o macro. Todos podemos e devemos contribuir para a nossa própria independência energética.
Este deve ser um dos poucos temas da atualidade que, de forma egoísta, a todos nos torna profunda e paradoxalmente altruístas, em prol de um bem maior!
Sara Ramos
Especialista em Auditoria Energética
Parceria INSEN
05.09.2024
Não tenhamos dúvidas! Sim! O impacto de trocarmos uma lâmpada led que seja, contribui para o todo. Sim! O facto de substituirmos um esquentador normal por um de condensação tem impacto. E sim!… o simples gesto de desligarmos os disjuntores e diferenciais não essenciais quando vamos de férias ou de fim-de-semana, contribui para o Desígnio Europeu de 2050. Há que ter plena consciência, não é possível efetuar qualquer transição energética, sem o contributo de cada um de nós.
Após mais de quatro décadas de debates e legislação direcionados para a eficiência energética, uma crise recente, mais uma, trouxe à tona a verdadeira questão que há muito aguardava destaque. Tornou-se claro que a transição energética é um empreendimento que requer a participação e o compromisso de cada indivíduo. Finalmente, a verdadeira questão pode borbulhar à superfície.
Portugal, historicamente, deu um passo importante em 1973, durante a crise do petróleo, ao estabelecer regulamentação pioneira. Essa regulamentação, oficialmente publicada em 1982, Decreto-Lei 58/82, de 26 de Fevereiro, determinou que indústrias consumidoras intensivas de energia deveriam conduzir auditorias energéticas. Isso significava que essas empresas tinham a obrigação de entender qual a origem da energia consumida, qual a sua utilização e por que razão estaria a ser dissipada ou, por outras palavras, desperdiçada. Além disso, as indústrias eram compelidas a implementar medidas para racionalizar o consumo de energia nas instalações. Surpreendentemente, esta regulamentação permanece em vigor até aos dias de hoje, com poucas modificações em relação à sua versão original. Esta legislação em particular, publicada em 1982, repare-se, há 42 anos, obrigava à monitorização dos consumos energéticos e à implementação de medidas que mitigassem esses mesmos consumos, pasme o leitor, 8 anos volvidos após o 25 de Abril de 1974. Inclusivamente, previa e obrigava que, as indústrias consumidoras intensivas de energia – que, à época, infelizmente, eram em número mais avultado – realizassem uma auditoria energética, isto é, que conhecessem, as fontes de energia consumidas, onde, como, quando e porquê as mesmas eram disseminadas, e, mais significativo ainda, que estabelecessem medidas de racionalização de energia, que deveriam ser obrigatoriamente implementadas na instalação em causa. Parece inacreditável que esta legislação pouco tenha evoluído nos 42 anos volvidos.
Desde 1982 até hoje, foi publicado um número infindável de diplomas, regulamentos, portarias, despachos, notas técnicas e afins, cujo objectivo final é similar: contribuir para a eficiência energética do país como um todo. Como tal, e de forma idêntica a outras áreas de actividade, cuja regulamentação não conheço em profundidade, o tema premente não é a falta de regulamentação e, sim, a total ausência de verificação e fiscalização do cumprimento da mesma. Alguém acredita que em Portugal apenas existam cerca de 1400 instalações nestas circunstâncias?
Por todos estes motivos, muito me surpreende que em plena crise energética o PRR continue a não sofrer uma reestruturação profunda e não reforce os concursos que mais candidaturas tiveram. A título de exemplo posso referir que houve cinco alterações na 2ª fase do Programa Edifícios Mais Sustentáveis, a maior parte das quais destinada a reforçar a dotação orçamental, que neste momento se encontra em 135 M€ (inicialmente o valor situava-se na ordem dos 30M€). Traduzindo, o comum cidadão, proprietário de uma fracção, que tendo direito no máximo a 7.500€ de benefício (independentemente de ter vinte casas para melhorar ou apenas uma) e sendo obrigado a investir o valor total da remodelação/instalação antes de saber, sequer, se a mesma seria aprovada, sujeito a processos burocráticos e complexos e, por fim, submetido a requisitos do arco da velha, fê-lo!
Fê-lo, porque queria melhorar as condições da casa onde vive, da fracção que aluga, do património de família, da casa de férias, entre muitas outras situações similares. Quanto ao programa em causa, não se prevê qualquer novo aviso ou reforço, ou ainda a análise das candidaturas cujo prazo de submissão fechou em Outubro passado. O próprio Fundo Ambiental informou no passado dia 22 de Abril que “todas as candidaturas se encontram no estágio “Submetida”. Qualquer atualização ao estágio das candidaturas será notificada a cada candidato, através do endereço eletrónico registado nas mesmas. Até ao momento, não existe previsão da abertura de uma nova fase do programa nem quais os requisitos e condições da mesma.”
No caso dos edifícios de serviços, a situação é mais gritante ainda, apenas um único aviso, dotação total 20M€. De acordo com os planeamentos apresentados e tornados públicos, quer do Governo, quer da Comissão Europeia, está prevista, até 2030, a transferência de 50 mil M€, repito, 50 mil M€, dos quais, de acordo com a informação constante no site do Recuperar Portugal, apenas 1.22% serão investidos na produção de energias a partir de fontes renováveis e/ou eficiência energética. Importa referir, que, dos 610M€ previstos no PRR para a eficiência energética, 240M€ serão destinados à administração pública central, não considerando a local. Contra factos, não há argumentos.
Mudam-se os governos, e neste caso em particular até é admissível que não seja possível mudar a vontade, mas a necessidade emergente de conseguir potenciar todos os fundos possíveis para este propósito, deveria ser uma prioridade.
O futuro passa, indubitavelmente, pelo isolamento de cada m2 de parede em contacto com o exterior, por cada kWh produzido a partir de renováveis, por cada alteração que conduza a uma poupança energética, por muito insignificante que seja, e sim, o Estado, e particularmente, os fundos atribuídos pela União Europeia, podem e devem contribuir para este objectivo. A questão da eficiência energética deve ser sempre estudada, analisada e especialmente incentivada, do micro para o macro. Todos podemos e devemos contribuir para a nossa própria independência energética.
Este deve ser um dos poucos temas da atualidade que, de forma egoísta, a todos nos torna profunda e paradoxalmente altruístas, em prol de um bem maior!
Sara Ramos
Especialista em Auditoria Energética
Parceria INSEN
05.09.2024